
Daqui vejo milhares de pessoas e boas intenções e motivos pra ser feliz. Mas onde eu estou? Advinhe? Estou em casa, sozinha, como se não houvesse nada. Como se tudo isso fosse cruel justamente por ser bom. O bom acaba. Mas isso aqui, o refúgio da ansiedade e da alegria, essas duas coisas do demônio, isso aqui é verdadeiro e é daqui que estou, na verdade, no meio de todas essas pessoas boas e os motivos pra ser feliz. É só daqui. Então, quero ir embora. Ir embora pra chegar logo. Porque enquanto estou é insuportével, mas depois, quieta, deitada, o mundo inteiro se encaixa aos poucos até eu pegar no sono e sentir a matéria de estar viva. Não evaporo mais pois estou me apertanto até ficar quieta nessa caixinha minuscula que trago tão bem guardada apesar do desespero em ser aberta.
É sempre na falta que vivo. É sempre em cima da altura que não tenho que olho o mundo. E das coisas que não sei que falo melhor. E dos sentimentos que eu não poderia sentir que me abasteço pra ser alguma coisa além do que me faz mais uma. E da incapacidade de ser mais uma que me agarro, pra poder participar de algo e esquecer como é maluco tudo isso. É na alegria extremada que sinto o tamanho do sofrimento que posso aturar.
É a loucura que sai antes quando preciso rapidamente ser normal. (...) É de onde não se pode estar que tenho saudades. É para o lugar do qual fugi que vou quando corro. É no lugar insuportável que fico quando descanso de algo que não aguentei. É na falta que vivo. O tempo todo sendo a mulher pra você que nem você quer. O tempo todo sendo a mulher que você não vê mais e só por isso, agora, te vejo o tempo todo. É te amando tão infinitamente que me liberto de gostar pelo menos um pouco de você.
(...) Não lido bem com a fome, pois ela me sacia, me enche, de algo que me faz além do bicho. (...) No fundo do gostosinho da alma mora o que dispara o meu incomodo mais terrível. Quando tento ser homem, meu Deus, sou mais garota que aquelas colegiais cheirando a floral com bola de basquete. Você reclamava que eu não dizia seu nome e isso era só porque eu o estava dizendo o tempo todo. Meu cérebro martelava o som das suas referências e imprimia tanto você que eu precisava falar de mim daquele jeito pra tentar existir além do que eu me tornava. (...)
O tempo todo o abismo gigantesco quanto mais desço. O tempo todo a calma mais incrível nos momentos de real desespero. E o pânico do que é simples de resolver. E se não tem ninguém pra chegar é aí que verdadeiramente espero. (...) Você não está e me olha como nunca. Você merecia ser amado assim, do jeito que acaba para começar. Uma covardia só pra quem aguenta firme. Sempre no oco me preencho tanto que explodo. É no nada que está tudo aqui. E quando me perguntam de onde vem essa pressa, esse desespero, essa corrida, o sopro no coração, essa ânsia, a força, essa agressividade. De onde vem? Eu digo que vem de uma preguiça enorme. E tantas artimanhas e rezas bravas pra permanecer? É só o mais completo desejo em acabar logo com tudo isso. Que tanto eu quero que estou sempre pedindo socorro? Nada. E principalmente: nunca. E morrer de novo como faço todas as vezes que me sinto viva demais. E vai começar tudo de novo só porque acabou. Ponto final é tanta continuação que vira três pontos finais. Eu não aguento mais e nem toquei na vida ainda. Consigo ser vista de verdade só quando as pernas e todo o resto que me move imploram pra eu desaparecer.
(Tati Bernardi)
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